Por Francisco Xavier Gomes
CACOAL: AS SINECURAS, AS PREBENDAS E A MORALIDADE…
A eleição de 2024 está encerrada e a diplomação dos eleitos e eleitas será hoje. Então, não existem razões plausíveis para questionamentos e, felizmente, não houve o fechamento da BR, por mágoas de derrotas nas urnas. Ufa!! Todavia, o universo político obediano segue turbulento, neste fim de ano, em virtude da aprovação de duas matérias no legislativo municipal que precisam realmente de uma profunda reflexão da sociedade, além de outros atos administrativos e políticos que depõem claramente contra os princípios constitucionais da moralidade pública e que, por isso mesmo, exigem a reflexão da sociedade. Os fatos estão relacionados com a criação ilegal de diversos benefícios financeiro aos vereadores, prefeito e secretários, e da decisão do prefeito de Cacoal de dobrar os valores das diárias pagas a agentes públicos municipais. O curioso é que muitas pessoas estão caladinhas, inclusive os vereadores…
Ao encerrar a legislatura, os vereadores decidiram criar, ao arrepio da legislação, o 1/3 de férias dos vereadores e outros penduricalhos. No frágil parecer jurídico, o Procurador Geral da Câmara municipal resolveu usar o argumento de que “todos os trabalhadores têm direito ao benefício” e justificou dizendo que há uma decisão do Supremo Tribunal Federal sobre o tema. Isso é verdade, mas a decisão do STF obriga todas as câmaras municipais a cumprirem as normas eleitorais em vigor, o que foi ignorado pelo ilustre procurador. No mesmo projeto que criou o 1/3 de férias, os vereadores alteraram a legislação eleitoral do país, o que configura um absurdo jurídico equivalente a imaginar que a Câmara de Cacoal tem a atribuição de revisar as matérias discutidas e aprovadas no Congresso Nacional. O grande problema disso tudo é que as matérias votadas não foram aprovadas por inocência dos edis ou por falta de informação. Foi por pura intenção de ferir a legislação eleitoral, fato que certamente vai levar os tribunais a invalidar a decisão, entre eles o Tribunal de Contas de Rondônia, citado no parecer jurídico, pelo Procurador Geral da Câmara de Cacoal como tendo legalizado a lambança. Que fique claro: o TCE/RO não autorizou!
As matérias aludidas receberam o voto contrário do vereador Paulo Henrique Silva, que é advogado e sabe muito bem que há diversas ilegalidades. Aliás, o vereador Peagá tem sido um dos raros vereadores desta legislatura a levar o mandato a sério, porque prioriza a legislação, a técnica e o cumprimento ao juramento feito em janeiro de 2021, quando tomou posse. Outra voz técnica sobre as equivocadas matérias partiu do advogado Tony Pablo, vice-prefeito eleito em 6 de outubro. Ele usou as redes sociais para dizer que conversou com o prefeito e avisou sobre as muitas ilegalidades dos projetos aprovados. Embora as matérias sejam de iniciativa do Poder Legislativo, Adailton Fúria usou suas redes sociais para dizer que são legais e necessárias, alegando que que precisa ter seu salário aumentado para que tenha condições de contratar médicos. O argumento do prefeito poderia até fazer algum sentido, caso não houvesse as normas a serem cumpridas. Ambos os projetos somente poderiam surtir efeitos legais, casos fossem aprovados 180 dias antes da eleição e após a posse dos eleitos. Qualquer estudante do primeiro período do curso de Direito sabe disso…
Para fechar o ano político do município, o prefeito de Cacoal assinou um decreto que vai dobrar os valores pagos em diárias para ele, secretários, demais assessores e outros servidores. Atualmente, uma diária de um secretário municipal que viaja para outro estado é de R$ 900,00. Com a mudança, passará a ser de aproximadamente R$ 1.700,00. O valor do salário mínimo hoje é de R$ 1.412,00, bem menos do que o valor de uma diária de um secretário municipal de Cacoal. Como o aumento chegou perto de 100%, não se sabe qual foi o parâmetro dos índices inflacionários utilizado pela administração para adotar a medida. Claro que pouca gente ficou sabendo do assunto, porque grande parte da população está muito mais interessada em fazer fotos na árvore de natal colocada no Beira-Rio. A medida também criou uma novidade, porque, a partir de agora, os valores das diárias vão aumentar automaticamente a cada ano, sem necessidade de novos atos, porque será corrigida pela unidade fiscal. Estranhamente, nenhum dos vereadores falou sobre o assunto, mas isto deve ter relação com o espírito natalino…
Esse festival de lambanças jurídicas, políticas a administrativas não ocorre por mero acaso. Aliás, não existe acaso nos atos políticos. Obviamente que a finalidade é proteger sinecuras, prebendas e outras situações. Vale ressaltar que muitas dessas pessoas fazem discursos emocionantes dizendo que é preciso ter zelo com a coisa pública, e batem o pé para dizer que tudo funciona muito bem apenas na iniciativa privada. Ora, bolas!!! Se as pessoas que fazem esses discursos são as mesmas a promover esse tipo de situação, fica difícil imaginar que possuem algum compromisso com a probidade no serviço público. Isto, sim, é rasgar a Constituição Federal, especialmente o badalado Art. 37, que simplesmente foi atropelado pelos políticos de Cacoal, poucos dias após a eleição, quando falaram tanto em honestidade, dignidade, moralidade, seriedade… Tenho dito!!!
FRANCISCO XAVIER GOMES
Professor da Rede Estadual e Jornalista