Cacoal/RO, 4 de maio de 2024 – 12:46
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4 de maio de 2024 – 12:46

O Emílio Francês – Por Paulo Cordeiro Saldanha

Paulo Saldanha é escritor, com 11 livros publicados. Assina a Coluna CRÔNICAS GUAJARAMIRENSES

Magrinho, com seu chapéu elegante, sempre bem vestido, lá vinha ele, montado na sua bicicleta, muito bem equipada. A meia do pé direito abarcando a bainha da calça, visando protegê-la da corrente, sempre bem engraxada, da sua bike.

Sua casa ali na Leopoldo de Matos, quase ao lado do hoje Jamaica Hotel, ficava de frente à residência do Lucio Carvalho. Quando saia pedalando, ora com a mão direita, ora com a esquerda ia saudando, sempre com excelente bom humor, um conhecido aqui, outro acolá. Às vezes, uma saudação entre os dentes significava uma apimentada dose de humor picante, muito ao seu jeito e com aquele sotaque afrancesado muito seu.

Como o pai do Paulo e da Gisela a eles transferiu excelente educação. O Paulo, ainda rapaz, rumou em direção à Escola de preparação de Sargentos da Força Aérea Brasileira, aonde chegou a ser Oficial. A Gisela casou-se com o Humberto Cohen Lopes, fundando uma bem formada família.

É evidente que o meu personagem desta semana é o “seu” Emilio Sarde, o nosso Emilio Francês, sempre alegre, solicito e, às vezes, irreverente, sempre pronto para disparar umas piadas que se, arrepiavam os mais puritanos, deliciavam os apreciadores das anedotas imaginativas, criativas e maliciosas.

Crítico mordaz da estrutura orgânica e física do homem não se conformava com a quantidade de dedos na mão em contraposição a unidade isolada do órgão sexual da espécie homem. E filosofava: para que tantos dedos? E por quê só um (?)… E ia destilando a sua verve em favor de uma mudança necessária na anatomia do homem, inclusive e a partir dele próprio, um namorador inveterado, ainda que essa transformação reduzisse a quantidade de dedos das mãos.

Chegou a ser Tradutor a serviço da Guaporé Rubber Company, pois era um poliglota de primeira, já que manejava com fluência absoluta os idiomas Alemão (morou muitos anos na Alemanha, vivendo com um tio), o Inglês, o Espanhol e o Italiano, isto sem falar no francês a sua língua mater.

Foi comerciante no ramo de cigarros, charutos e bebidas finas. Bom gourmet admirava uma comida preparada com iguarias sofisticadas, desde que consumida  de forma lenta, ao sabor complementar de um refinado vinho francês.

Ele era um amante das boas coisas que o mundo lhe favorecia conhecer. Conversar com ele era um culto à sabedoria, à filosofia e a descontração. O “seu” Emílio, o francês, idolatrava as músicas da sua terra de origem, mas se deleitava com um samba-canção, um bolero ou um tango. Apreciava o pôquer e o dominó. No antigo Clipper era visto sempre em boa companhia.

Na verdade o “seu” Emilio Francês era um filósofo, sua casa era dotada de boa biblioteca de livros variados sempre de publicações nos idiomas em que era versado. Como lia muito, poder-se-ia dizer que ele era um homem culto. Antes de chegar ao Brasil, ele e um outro companheiro aventuraram-se através da Via TRANSANDINA e, saindo do Chile, chegaram a Oruro na Bolívia e de lá, ele, sozinho, aportou em Guayaramerin, onde se fixou, antes de mudar-se para o lado de cá. Ocorre, que já se tinha casado com a senhora Cristina Oyola, Mãe do Paulo e de Gisela Sarde, e, como detinham bom padrão de vida, possuíam motor de luz e um possante rádio com suas poderosas antenas, o que lhe valeu a desconfiança de que se tratava de um espião norte-americano. Naquele tempo a Bolívia tinha uma boa quantidade de espiões alemães; a borracha boliviana aguçava o interesse nazista.

Como passou a ser hostilizado pelos apologistas da cultura germânica, vendedores de borracha boliviana aos nazistas, transferiu sua residência para este lado brasileiro e trouxe o motor de luz, as antenas e o rádio possante. Costumava vir remando de Puerto Sucre até Guajará, numa canoa em que se valia de dois remos.

Aqui montou um pequeno negócio em que vendia no atacado cigarros de marcas estrangeiras e, depois, tornou-se representante das Revistas “O Cruzeiro” e “Manchete”. Sabia-se que tinha boa poupança guardada, o que lhe valia a desconfiança de que era funcionário do FBI, já que não enfrentava dificuldades financeiras, mas, por outro lado, não ostentava riqueza que o levasse ao desperdício.

Namorador emérito, sabia reverenciar a beleza, a graça e os outros atributos de uma mulher, admirando-lhe da cabeça aos pés.

Seus amigos eram tantos, mas o Almerindo Ribeiro dos Santos, o Capitão Alípio e Dom Rey eram seus mais próximos camaradas. Dom Rey então se transformou num dos seus confidentes, embora não fosse católico e professasse a doutrina Rosa Cruz.

Aqui e em função do espírito aventureiro que o energizava procurava ouro e outros metais preciosos nos rios Cautário e Pacaas Novos.

A sua descendência mantém intactas muitas e muitas lembranças, principalmente o Paulinho Sarde Lopes, o neto de sua predileção e que foi o seu grande companheiro já na velhice de um avô que se orgulhava da família que viu crescer e se multiplicar.

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